Iniciativa de estudantes do 8° ano de escola municipal de Tremembé (SP) promove oficinas e orientação profissional com especialistas de diversas áreas.
A juventude é uma fase de muitos questionamentos e dúvidas. Apesar disso, é justamente nessa época que são cobradas tantas respostas definitivas sobre a vida e a carreira. Com mais dificuldade de acesso a direitos como cultura, educação e lazer, jovens de regiões periféricas sofrem com a falta de perspectivas profissionais.
A escola, que deveria ser o lugar da experimentação e das múltiplas oportunidades, nem sempre dá conta de responder à angústia dos adolescentes com relação ao futuro. E foi pensando em reverter esse cenário que um grupo de estudantes de uma escola municipal de Tremembé se mobilizou para resgatar junto com colegas sonhos e expectativas que ficaram perdidos em meio às incertezas do cotidiano.
O projeto Futuro em Foco apoia os estudantes na escolha de sua carreira profissional. Por meio de oficinas e do contato com profissionais de diversas áreas, os jovens tiram suas dúvidas sobre cada carreira e conhecem um pouco da realidade de quem já atua no mercado de trabalho.
Jovens do projeto realizam rodas de conversas sobre o futuro – Foto: Divulgação
É o que comenta a estudante Kariny da Silva, de 15 anos: “A nossa ideia foi procurar jovens que ajudassem jovens, e nesse processo, acabamos descobrindo muitos talentos na escola. Além disso, criamos uma rede com mais de 80 profissionais voluntários”.
O projeto surgiu em 2018, após uma reunião do grupo de estudantes do 8° ano da Escola Municipal Comendador Teixeira Pombo com a equipe do Criativos da Escola, na Secretaria de Educação do município de Tremembé. Nesse encontro, os jovens conheceram um pouco mais sobre outros projetos vencedores do Desafio Criativos da Escola e assistiram a um trecho do documentário “Nunca me Sonharam”, dirigido por Cacau Rhoden.
Do estigma a novas perspectivas para o futuro
A escola de Kariny e seus colegas de grupo fica localizada em uma área de fronteira, entre as cidades de Tremembé e Taubaté. Ela está distante do centro de ambas as cidades e muito próxima de todos os presídios da região. Isso faz com que alguns alunos passem por sete penitenciárias diferentes para chegar à escola.
Então, além de lidar com a extrema vulnerabilidade social, a comunidade escolar ainda enfrenta um forte estigma por se localizar muito próxima aos centros de detenção. Diante desse contexto, os jovens se sentiam desmotivados e desesperançosos com relação a seu próprio futuro.
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Depois de refletirem sobre sua realidade, a turma percebeu que a melhor forma de transformar suas trajetórias seria investindo em autoestima e no contato com outras possibilidades de vida, diferentes daquelas às quais estavam habituados. Os estudantes organizaram rodas de conversa e criaram um questionário para que seus colegas pudessem expressar suas angústias e sonhos para o futuro.
“Muitos amigos sequer tinham pensado no que eles queriam ser no futuro. Nossa autoestima estava tão baixa que não imaginávamos que poderíamos ter nossa própria renda e muito menos fazer alguma faculdade”, comenta a estudante Kariny.
Para a professora orientadora do projeto, Verônica Caetano, as respostas ao questionário foram realmente preocupantes. “Os alunos não identificaram a escola e as aulas como algo construtivo para um projeto de vida, e foi aí que essa turma enxergou uma ‘luz’ no fim do túnel, criando oficinas feitas por jovens e para jovens”.
Mundo do trabalho, experiências compartilhadas e novos olhares
Estudantes realizam oficina de edição de vídeo – Foto: Divulgação
Dentre as oficinas criadas pelo projeto Futuro em Foco destacaram- se as de informática, maquiagem, música, edição de vídeo, fotografia e currículo. Essa última oficina foi organizada pelos estudantes como uma estratégia para orientar os colegas na construção de seu primeiro currículo.
Os integrantes do projeto convidaram, ainda, universitários e profissionais formados no ensino superior para gravarem vídeos esclarecendo as dúvidas da turma e contando um pouco mais sobre suas áreas de atuação.
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“Construímos uma grande rede de profissionais e tivemos também o cuidado de buscar voluntários que tivessem saído da escola pública para que nossos alunos se fortalecessem dentro dessa realidade”, relata Verônica.
Estudantes fazem oficina de maquiagem profissional – Foto: Divulgação
Ao final de 2018, a postura da turma mudou. Com as esperanças no futuro renovadas, o grupo de jovens passou a se empenhar para transformar os sonhos em realidade. Nos corredores, as conversas eram outras: datas de provas, conteúdos cobrados em vestibulares, opções de bolsas de estudos.
“Ver a forma como meus colegas começaram a falar de seu próprio futuro foi muito gratificante. Compartilhamos muitas experiências e aprendizados” traz Kariny.
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Além de receber o prêmio de destaque municipal do Criativos da Escola, duas estudantes do projeto – Kariny da Silva e Caroline Mendonça – receberam o convite para se tornarem madrinhas de uma estação de leitura da cidade de Tremembé, o que trouxe ainda mais força ao Futuro em Foco.
Mobilização jovem e novos rumos
No ano seguinte, houve uma reestruturação de projetos escolares dentro da Secretaria de Educação da cidade. A ideia foi unificar as propostas e criar uma rede jovem de mobilização social. Assim, o Futuro em Foco continuou com as oficinas e orientações profissionais na escola municipal Comendador Teixeira Pombo, mas também se dispôs a contribuir com essa nova rede de mobilização social.
Jovens em conversa sobre o Setembro Amarelo – Foto: Divulgação
Nesse novo momento do projeto, o grupo de jovens começou a pensar em ações que pudessem ser levadas a outros espaços educacionais. É o que conta a aluna Caroline Mendonça, de 15 anos: “Nós expandimos os temas das oficinas, trazendo mais cultura, lazer e diversão para a juventude da nossa comunidade, sem perder a essência do Futuro em Foco”.
Uma das últimas ações do projeto, em 2019, foi a criação de um cursinho preparatório para o colégio técnico. Hoje, muitos alunos da turma estão cursando o Ensino Médio Técnico e se preparando para o vestibular.
Caroline é um desses exemplos. “Antes do projeto, eu não sabia exatamente qual curso queria fazer. O Futuro em Foco permitiu que eu conhecesse melhor minhas opções e me fez perceber que eu realmente queria prestar Medicina”.
Atualmente, devido à pandemia do novo coronavírus, as ações presenciais do projeto estão suspensas, mas as orientações profissionais e oficinas devem continuar acontecendo de forma virtual. A ideia da equipe é manter o Futuro em Foco vivo para que jovens de outras turmas assumam a responsabilidade pelo projeto para que ele continue transformando a realidade de toda a comunidade escolar.
Redação: Laura Fontana Novo
Edição: Helisa Ignácio
