Em busca de aproximar alunos de diferentes origens, estudantes de Aracruz (ES) divulgam cultura de povos nativos da região.
Quem chega à Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Primo Bitti, em Aracruz (ES), logo aprende a usar a terminologia correta para se referir ao grupo ao qual pertencem alguns alunos: povos nativos. “Não usamos as palavras “índios” ou “indígenas” que, segundo aprendemos, podem ter conotação pejorativa por estarem relacionadas à mesma raiz de ‘indigente’”, explica Izamara de Souza, de 18 anos, que concluiu o 3º ano do Ensino Médio no colégio no ano passado. Segundo ela, prestar atenção ao significado de cada vocábulo que usamos é fundamental e o termo “nativos” representa de maneira apropriada os povos originários de cada região.
O aprendizado faz parte do projeto “Olhares e saberes: povos nativos”, no qual os alunos de Ensino Médio do colégio criaram atividades culturais a partir de visitas feitas para conhecer melhor as aldeias da região. Dramatização de lendas, palestras dos alunos, teatros, desfiles e falas de caciques foram algumas das atividades realizadas pelas turmas. Como um de seus resultados, a iniciativa foi finalista do Desafio Criativos da Escola 2017.
A ideia de realizar ações para aproximar os estudantes nativos dos demais surgiu a partir da constatação de que, apesar de conviverem por anos em sala de aula, os dois grupos permaneciam segregados. “Nossa escola é basicamente composta por nativos, mas muitos deles falavam apenas entre si e em seu próprio idioma. Isso mostrava que, mesmo estudando na mesma série, havia poucos laços de amizade”, observa o integrante do grupo Matheus Rocha, de 18 anos, que concluiu o 3º ano do Ensino Médio em 2017. “O projeto foi criado para sabermos mais sobre eles e para demonstrar que podemos ser sensíveis à sua cultura”, explica.
Mais proximidade, menos preconceito
De acordo com a professora de história Sandra Guimarães, a Sandrinha, há grande diversidade entre os alunos e boa parte deles é originária das aldeias Guarani e Tupiniquim. “Ouvíamos algumas piadas preconceituosas, dizendo que índios são preguiçosos, por exemplo”, lembra. A professora constatou que poucos estudantes sabiam detalhes sobre os povos nativos e a maioria, apesar de viver nas proximidades, nunca havia visitado uma aldeia.
“Os Guaranis são tímidos, estão em menor número e aprendem a falar português apenas com oito anos de idade. Por isso, convidei primeiro os Tupiniquins para um bate papo com a turma, para contar sobre sua cultura e modo de vida”, conta Sandrinha sobre o início das atividades.
Depois disso, a turma realizou visitas às aldeias para conhecer a rotina de seus moradores. “Após as visitas, tivemos muitas ideias para apresentar para as pessoas o que a gente viu. Nem todos os alunos puderam ir a todas as aldeias, mas cada um encontrou algo que achou interessante para compartilhar no projeto”, recorda Matheus.
Segundo ele, as visitas às comunidades serviram também para proporcionar descobertas aos jovens: “como minha família tem uma parte indígena, eu já havia ido muitas vezes a aldeias. Mas, para alguns colegas, foi a primeira vez: eles ficaram eufóricos ao ver o jeito que os povos nativos tratam a natureza.
A partir das excursões, com o incentivo da professora, os alunos se engajaram em várias atividades para multiplicar o que aprenderam com os nativos. “As iniciativas partiram dos alunos: um queria fazer um desfile, outro [uma peça de] teatro para encenar uma lenda ou filmar um documentário”, lembra Sandrinha.
Os alunos e a professora explicam que o projeto ajudou, lentamente, a derrubar as barreiras existentes entre os grupos de alunos. “Os Guaranis ficavam sempre no cantinho e havia muita evasão escolar da parte deles. Hoje combatemos um pouco disso e os Guaranis se adaptam melhor”, explica a professora Sandrinha. Segundo ela, além disso, todos os alunos – Guaranis, Tupinambás e os demais – se beneficiaram da maior integração entre jovens que passou a acontecer em sala de aula.
Entre as mudanças geradas pelo projeto, está a nova forma que a comunicação acontece dentro do ambiente escolar. “A comunicação na escola não era horizontal: [a conversa] sempre acontecia entre diretores e professores e não chegava aos alunos. Quisemos abrir os canais para que a comunicação existisse e, durante o projeto, a professora Sandrinha sempre nos deu liberdade para criar e dialogar”, conta a então estudante Izamara.
Sandrinha explica que, embora não tenha dado continuidade ao projeto em 2018, principalmente devido aos altos custos, está a procura de maneiras de seguir com as atividades em breve: “embora estejamos a 5 minutos de ônibus das aldeias, os deslocamentos têm custo alto. Só gosto de promover este tipo de atividade quando todos os alunos podem ter a chance de participar”.
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Redação: Júlia Matravolgyi
Edição: Gabriel Maia Salgado
Imagens: Divulgação