Estudantes de Senador Pompeu (CE) provocam discussão sobre representação negra e questionam estereótipos de beleza
Diante dos preconceitos sofridos por serem negras e terem cabelos crespos, três alunas do 3º ano do ensino médio da Escola Estadual de Educação Profissional Professor José Augusto Torres, de Senador Pompeu (CE), criaram grupo de estudos e rodas de debates sobre os padrões de beleza estabelecidos pela sociedade, a não-aceitação de seus cabelos naturais como belos e o empoderamento jovem.
Com atividades em escolas públicas e privadas da região desde 2015, o projeto “Crespinianas” trata de temas que vão para além do cabelo crespo, abordando assuntos como preconceito racial, feminismo, estética e beleza negra. Hoje, cerca de quarenta garotas participam direta e indiretamente das ações promovidas pelo grupo.
No ano passado, as estudantes conquistaram o primeiro lugar na feira de projetos da escola e a segunda posição na Feira Regional de Ciências e Cultura, organizada pela Secretaria Estadual de Educação do Ceará. Por meio, também, de uma página no Facebook, as jovens contribuem para mudanças não apenas no ambiente escolar com o combate aos preconceitos, mas também para a construção da identidade das alunas. “O projeto teve um grande impacto na minha vida e na minha auto aceitação. Foi a partir dele que eu comecei a gostar de mim do jeito que sou e não como as pessoas diziam que eu deveria ser para ficar bonita”, relata a estudante Joyce Silva.
Texturas e questionamentos
A partir de atividades da semana da Consciência Negra, em novembro de 2015, as alunas começaram a questionar os preconceitos sofridos no ambiente escolar. “O que me motivou foi o fato de já ter sido discriminada por causa do meu cabelo crespo. Por muitas vezes, quis escondê-lo”, lembra Joyce. Para transformar esta realidade, as jovens Joyce, Giselle Viana e Yasmin Lima se articularam com outras meninas da escola. “Foi a partir destas conversas que decidimos abordar estes temas do empoderamento feminino e da busca de aceitação do jovem”, explica a estudante Yasmin.
Com o grupo ampliado e com dúvidas sobre o surgimento de padrões de beleza, sobre o efeito dos preconceitos para mulheres negras e sobre o papel da família e da sociedade diante deste problema, as estudantes convidaram o professor de sociologia Denis Lima para apoiá-las na criação de um grupo de estudos sobre estes temas. “Ouvimos muitos relatos de meninas de todas as faixas etárias, de como foram discriminadas e desvalorizadas por sua cor e pela textura de seu cabelo”, descreve Denis.
Em uma das ações do projeto, as estudantes entrevistaram pessoas da comunidade para saber se elas eram a favor ou não do alisamento de cabelos. “Um cabeleireiro nos disse que o alisamento químico é o mantra das mulheres que frequentam os salões de nossa cidade”, conta Giselle. No entanto, as estudantes destacam a importância de se respeitar as escolhas de cada pessoa. “A ideia é libertar as pessoas dos padrões, mas de forma alguma tentamos convencer alguém a usar o cabelo natural”, ressalta.
Compartilhando aprendizados
Ainda que estejam ampliando suas ações, as estudantes relatam que ainda enfrentam o desafio pela falta de diálogo dentro e fora da escola. “É difícil fazer com que algumas pessoas entendam que esse tema não é vitimismo”, conta Gisele. Como estratégia para superar esta barreira a aluna explica que pretendem expandir o compartilhamento das descobertas e aprendizados do grupo: “ainda este semestre vamos fazer um encontro com as crespas e cacheadas de outras escolas integrais da região”.
Com o objetivo de ultrapassar os limites do município, as alunas devem inaugurar um canal no Youtube em maio e estão produzindo um documentário sobre a libertação de padrões de beleza e o empoderamento de meninas negras. “Queremos mostrar que elas devem acreditar em si mesmas e acabar com a ideia de inferiorização da beleza negra”, pontua Giselle.
Para o professor Denis, o “Crespinianas” propiciou não só mais uma espaço de diálogo, mas também a quebra de paradigmas na escola: “fico feliz quando consigo olhar nos olhos dessas alunas e perceber como o projeto fez com que a gente se despisse de preconceitos e fortalecesse bandeiras tão significativas para elas e para uma melhor educação de todos os alunos”, opina.
Redação: Vanessa Ribeiro
Edição: Gabriel Maia Salgado
Imagens: Divulgação