Projeto viabiliza a produção de placas de sinalização em braille para que cegos possam circular pelos centros urbanos com segurança e autonomia.
O último censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010, aponta que cerca de 24% dos brasileiros e brasileiras têm algum tipo de deficiência. No estado de Alagoas, esta proporção é maior e chega a 27% dos habitantes da região, totalizando quase 850 mil pessoas.
Porém, estes números não têm refletido em ações para possibilitar autonomia, segurança e acesso às pessoas com deficiência (PCDs), conforme determina o Estatuto da Pessoa com Deficiência, criado pela Lei Federal nº 13.146. Após pesquisar sobre esta realidade, um grupo de alunos da Escola SESI Industrial Abelardo Lopes, de Maceió (AL), resolveu fazer algo para mudá-la.
Percebendo a dificuldade de estudantes cegos para transitarem pelas ruas da cidade e até mesmo dentro da escola, a equipe criou o projeto “Placas em Braille Sustentáveis”. A iniciativa foi premiada na última edição do Desafio Criativos da Escola.
O contato com uma colega surda na escola motivou a equipe a conhecer e se aprofundar sobre a realidade das PCDs na região. O que mais chamou a atenção na investigação dos alunos foi o descumprimento das leis em relação a acessibilidade. “Nossa cidade sequer cumpre com a infraestrutura básica para que todos tenham autonomia, por mais que haja legislações que deveriam fazer com que a infraestrutura urbana fosse adequada” relata Jhonata Silva, 16 anos, um dos integrantes do projeto.
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Cientes de que não seria possível criar soluções para todas as problemáticas levantadas em relação à falta de acessibilidade, o grupo optou pela produção de placas em braille. Os estudantes constataram que, embora seja fundamental para as pessoas cegas, a sinalização adequada é muito cara e muitos estabelecimentos não tinham recursos para implementá-la.
Colocando a mão na massa
Os adolescentes passaram, então, a pesquisar sobre as normas técnicas para desenvolver placas dentro dos padrões. Para tornar o produto mais acessível, optaram por utilizar materiais reciclados. Dessa maneira, não só reduziram o custo final de cada placa, como colaboraram com o meio ambiente, aliando acessibilidade com sustentabilidade. “Começamos a elaborar métodos para criar uma placa em braille, dentro de todas as regulamentações e que fosse acessível e eficaz, a fim de implantar no máximo de instituições possíveis”, contou Jhonata.
Depois de um longo período de testes com diversos materiais, como latas de tinta, papelão, e até mesmo tecidos, concluíram que o ideal era utilizar os canos de PVC (Policloreto de Vinila) e PP (Polipropileno), comuns em construções. Entre as vantagens dos materiais estão a facilidade de manuseio, o baixo custo e a possibilidade de recolhê-los entre os descartes de obras na cidade, reduzindo, também, a produção de lixo. Além disso, o PVC e o PP apresentaram boa resistência à eletricidade, umidade e possíveis mudanças climáticas no ambiente.
O processo de criação das placas e testes foi realizado no laboratório de ciências da escola. Os retalhos de cano PVC foram aquecidos com equipamentos especiais para serem cortados e manuseados. Depois, os alunos utilizaram garrafas pet, fita adesiva e um Reglete (instrumento criado para a escrita em braille) para escrever as orientações indicadas em cada placa.
Com o protótipo pronto e aprovado pela Associação dos Cegos de Maceió, o grupo implantou as primeiras placas na Escola Estadual de Cegos Cyro Acyoli, também em Maceió. O feedback recebido foi positivo. Jhonata conta o quão gratificante é perceber que ajudou a desenvolver algo que vai facilitar o dia a dia de outras pessoas. “Um dos alunos falou que até mesmo o simples fato de ir ao banheiro era complicado, pois ocorria de ele entrar no banheiro feminino sem querer devido a ausência das placas em braille”.
E este é só o começo…
Os resultados vão além: os integrantes do projeto relatam importantes aprendizados com o projeto. “No Placas em Braille, tive a oportunidade de entender um pouco mais sobre a vida e dificuldades das pessoas com deficiência, além de me desenvolver na escrita. Tenho certeza que usarei essa habilidade em outras áreas da minha vida”, relatou Eduardo Monteiro, 15 anos.
Para a professora orientadora, Andrea Souza, é interessante quando debates em sala de aula se tornam sementes para projetos de transformação e despertam nos estudantes o interesse científico: “Estes projetos mudam a maneira do olhar do aluno, faz com que eles adquiram um mundo acadêmico de pesquisa já no Ensino Médio.”
Os estudantes planejam aprender mais sobre o tema e ampliar o projeto, buscando parcerias com empresas especializadas em reciclagem. Para Jayane, 17 anos, ainda há muito a ser feito para oferecer acessibilidade e autonomia para PCDs na região: “Nosso intuito é ampliar nossas pesquisas na tentativa de solucionar o máximo de problemas, e creio que com muitos avanços, podemos concretizar nossas metas”.
Redação: Andréa Xavier
Edição: Helisa Ignácio