Do exercício do sentir à escolha do título do plano de ação, o segredo para identificar um problema está na escuta atenta dos sentimentos e opiniões do grupo.
Como identificar um problema que genuinamente mobilize os estudantes? Confira abaixo algumas sugestões a partir do Material de Apoio do Criativos da Escola e exemplos inspiradores a partir de projetos realizados por estudantes de diferentes partes do Brasil.
O primeiro passo para identificar situações-problema pode ser começar com a livre expressão dos sentimentos de cada um e todos os estudantes. É preciso que o grupo esteja disposto a manifestar tudo aquilo que sente com relação ao seu cotidiano na escola e na comunidade. Aqui, é hora de pensar em situações que causam alegria, tristeza, admiração, entusiasmo, indignação, etc, e de traçar hipóteses sobre a origem dessas emoções. Por exemplo: “me sinto triste quando vejo a praça próxima à escola cheia de lixo”. Ou: “me sinto desmotivado quando não consigo entender um conteúdo difícil de matemática”.
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Os sentimentos podem surgir com relação ao outro também, como quando nos sentimos chateados com a forma como nossos colegas cuidam dos espaços comuns da escola, ou quando percebemos que nossos amigos estão perdendo o interesse nos estudos.
Foi justamente esse o problema identificado por Liliane, Alice e Joana, idealizadoras do projeto Células Motivadoras, da cidade de Santana do Cariri (CE). Percebendo que muitos colegas deixavam de frequentar as aulas, as meninas decidiram investigar as causas da evasão escolar. O que parecia ser um problema da turma acabou se revelando um grande problema estrutural não só na escola, mas que afeta milhares de jovens brasileiros.
“Nós percebemos muita desmotivação nos alunos e decidimos investigar se isso estava acontecendo em todas as salas. Aí, resolvemos conversar com a equipe gestora do colégio, fizemos algumas pesquisas e descobrimos que a evasão é um problema muito abrangente”, comenta a estudante Liliane Silva, de 17 anos.
Preocupadas com seus colegas, as estudantes procuraram os estudantes que tinham abandonado a escola para tentar entender seus motivos e descobriram que a vulnerabilidade social era determinante para o afastamento dos colegas das aulas. “Enquanto muitos ignoravam essa exclusão, nós decidimos ouvir nossos colegas e incentivá-los a retomar os estudos”, completa Liliane. Confira abaixo o vídeo sobre o projeto que foi premiado no Desafio Criativos da Escola 2019 e que segue transformando a realidade das escolas da região:
Olhar o que há de bom em cada território
Ainda dentro do exercício do sentir, é importante pensar também em aspectos que gostamos em nossas escolas e comunidades e que trazem bons sentimentos. Uma conversa sincera com os amigos na hora do intervalo, uma aula divertida e instigante ou a riqueza cultural e artística presente em nosso município são alguns exemplos.
Descobrir também o que gostamos, neste sentido, é valorizar o que temos em nossas comunidades. É a partir desse olhar apreciativo que podemos levantar possibilidades, recursos e apoios para transformar o que nos incomoda.
Foi deslocando o olhar dos sentimentos negativos para aquilo que há de bom na comunidade que um outro grupo de estudantes desenvolveu o projeto Apoio à Preservação Ambiental. O estopim da iniciativa foi o amor à comunidade e a necessidade de suprir a falta de água na escola localizada na cidade de Canindé de São Francisco (SE).
A pouca água usada para o consumo dos estudantes, professores e funcionários chegava por meio de caminhões-pipa e pouco sobrava para as plantações, que são a principal fonte de renda das famílias da região. Problema intensificado pela dificuldade de respirar e pouca variedade de verduras e frutas na merenda escolar.
Para além dos problemas vividos no dia a dia, o grupo de estudantes se conectou ainda mais com seu território, possibilidades e riquezas. Em parceria com pessoas da comunidade, as jovens puderam identificar os desafios e construir estratégias coletivas para enfrentá-los.
“A gente conversou com nossos professores de geografia e sociologia, nos reunimos com os moradores da região e desenvolvemos um planejamento de ações que contava com a ajuda de pessoas mais experientes que nós, da própria comunidade”, comenta a estudante Deysiane Lima, participante do projeto.
E, para efetivar o exercício do Sentir, estudantes e professores podem montar uma lista com todos os problemas que levantaram e compartilhar entre os integrantes do grupo. Depois de divididas as sensações e sentimentos é hora de debater as ideias e de selecionar o grande problema a ser enfrentado pela equipe.
Confira mais informações sobre a etapa do Sentir tanto no baralho de cartas A Missão quanto no material de apoio do Criativos da Escola.
Chegar a um consenso
A escolha de uma situação que afete os participantes e com a qual eles estejam realmente preocupados pode garantir o maior engajamento do grupo todo na construção do plano de ação ou mesmo do projeto. Portanto, é muito importante criar um ambiente onde as opiniões tenham passe livre. Nessa etapa, não há espaço para julgamentos e sim para a escuta gentil de tudo aquilo que os colegas falam.
Ao estabelecerem um canal de comunicação com estudantes do 6º, 7º e 9º ano, professores e equipe gestora da escola EMEF Assad Abdala, em São Paulo (SP) se surpreenderam com as perspectivas que os jovens tinham de sua própria realidade. Foi a partir da escuta atenta daquilo que os estudantes observaram em seu entorno que foi criado o projeto Para Além dos Muros da Escola: Intervindo no Jardim Maringá.
“Quando começamos a conversar com esses meninos e meninas, quando começamos a ouvi-los de verdade, descobrimos opiniões muito interessantes sobre a região, e uma das coisas que eles mais perguntavam para nós é por que eles moravam em um lugar tão feio”, explica a professora e diretora da escola, Nelci Chiarato. Confira abaixo como foi desenvolvido o projeto:
Para ajudar a organizar os argumentos dos estudantes, o grupo pode se reunir e conversar sobre os problemas levantados com sinceridade. Aqui, a dica é fazer um debate saudável e construtivo, estimulando em todos os participantes o ato de estar aberto para ouvir as justificativas de todos os colegas com apoio da mediação do professor.
Criar um título para o plano de ação
Após os estudantes chegarem a um consenso sobre qual problema será trabalhado pelo grupo, é hora de escolher um título criativo para o plano de ação ou projeto. A sugestão neste ponto é que alunos e alunas se esforcem para criar uma frase que sintetize o tema que decidiram trabalhar. Se não for possível se reunir presencialmente com o grupo todo, principalmente diante da necessidade de isolamento social com a pandemia, podem pensar individualmente e depois compartilhar as ideias com os colegas de forma virtual.
Para chegar ao título que represente as crianças e adolescentes participantes, pode ser interessante partir de músicas, poemas ou paródias sugeridas pelos próprios alunos e alunas. Neste sentido, o título do plano de ação ou projeto pode não ser exatamente original e não tem problema. O importante é que ele traga a essência daquilo que o grupo vai desenvolver, como é o caso do projeto Células Motivadoras, cujo nome foi adaptado de outra iniciativa parecida.
“A inspiração para o nome do projeto veio de uma cidade aqui do Ceará. Nesse distrito, alguns alunos se reuniam em células de estudo. Os que eram melhores em algumas matérias ajudavam os outros. Percebemos que nossa metodologia era muito parecida, então, adaptamos o nome à nossa realidade, de células de estudo para células motivadoras”, revela Liliane.
Redação: Laura Fontana
Edição: Gabriel Maia Salgado e Angélica Garcia