Alunos de Salvador (BA) realizam ação para discutir a questão racial e combater o preconceito na comunidade escolar
Preconceito contra raça, preconceito contra religião. Em um bairro negro e vulnerável de Salvador (BA), os alunos da Escola Estadual Antônio Sergio Carneiro viviam diariamente situações de intolerância e sentiam que a identidade da comunidade do Arenoso se perdia, enquanto a violência só aumentava.
Um grupo de alunos sugeriu o tema para uma gincana, batizada de “Gincana do Orgulho Negro”, com o intuito de amenizar as brigas a partir do envolvimento e da sensibilização de todos. Uma comissão com 5 professores e 10 alunos foi criada e os educadores das áreas de Linguagens e Ciências Humanas contribuíram, abrindo espaço na sala de aula para que o tema fosse pesquisado e debatido. Luis Gustavo Silva, do 1º ano do ensino médio, fez parte do processo e explica: “Houve reuniões da comissão para elaboração das tarefas. Eu fiz parte e gostei muito, aprendi muito também”, diz.
Em 2015, a escola passou a ser de tempo integral. Com isso, os alunos passaram a ter mais tempo para conversar – e agir – para mudar o que os afligia. Assim nasceu a Gincana Orgulho Negro, criada por eles para vencer o preconceito e a discriminação por meio de um forte envolvimento da comunidade escolar e do entorno. “Neste ano, as atividades foram pensadas com mais foco no aluno e na construção de um pensamento crítico e de igualdade”, conta Cássio Andrade, do 9º ano. Realizada nos dias 13 e 14 de outubro, a Gincana foi um evento social, recreativo e cultural e contou com a participação de muitas famílias e moradores do entorno. Para Luis Augusto Soares, do 8º ano, o contato com a família dentro do ambiente escolar é positivo. “A minha escola traz a comunidade para participar das coisas, não chama só para reclamar. É muito importante essa junção da família, moradores e escola. Todos temos que caminhar juntos”, opina. Todo o processo gerou forte impacto na vida dos alunos e trouxe novas perspectivas em relação ao ambiente escolar. “Esse ano a nossa identidade foi valorizada”, relata Cássio.
Os alunos fizeram a divulgação nas salas, decoração da escola, formação das equipes e criação das provas, que envolviam atividades que pudessem despertar a empatia e estimular a reflexão, como: criar uma paródia de uma música em homenagem aos negros, recitar um poema sobre um mártir ou liderança negra, trazer um representante religioso do bairro (de qualquer religião) para falar sobre preconceito, organizar um Desfile da Beleza Negra, apresentar uma coreografia de uma dança africana, trazer um morador antigo para falar sobre a história do bairro do Arenoso e convidar uma pessoa da comunidade para fazer um penteado de origem africana em um membro da equipe. Segundo Cássio, a ação mais divertida envolveu os professores: na tarefa surpresa eles foram chamados para dançar com os alunos uma música afro. “Foi muito legal, teve uma interação”, conta o jovem. Para muitos a ação mais emocionante foi o momento das falas dos representantes religiosos e moradores do bairro sobre preconceito racial. “Os depoimentos das experiências deles foram lindos”, diz Pedro Lucas, do 6º ano.
Os professores os apoiaram e ainda garantiram a participação dos demais alunos. “A gincana não teve teor de competição e sim de aprendizagem”, relata a coordenadora da escola, Rosana de Carvalho. Os membros participantes criaram uma página no Facebook para divulgar as equipes e tiveram muitos acessos. No meio do caminho, decidiram também organizar uma roda de conversa sobre a redução da maioridade penal, convidando ex-alunos da escola que estão inseridos na Universidade e que combateram o preconceito com estudo, informação e articulação. “Por causa do que eles falaram, vou estudar mais. Me senti motivado. Antes não via assim. Queria só concluir o ensino médio. Agora quero fazer faculdade e ter uma profissão”, conta Luis Gustavo.
Depois de tanto sucesso, a ação promete se repetir. “Acredito que a execução do projeto alcançou seus objetivos. Muitos alunos que tinham o preconceito racial nas suas atitudes passaram a rever as suas práticas”, conta Rosana. Os alunos também estão na torcida para que o processo seja duradouro. “Que sirva por muitos anos, valorizando nosso bairro, nossa escola e nossa família”, diz Cássio. Os frutos dos positivos esforços, eles já começaram a colher. “A minha autoestima está melhor. Consigo me valorizar e faço com que as pessoas me respeitem”, finaliza.
Redação: Vanessa Ribeiro
Edição: Marianne Estermann
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